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BENEFÍCIO FISCAL NO PARANÁ PODERÁ SOFRER REDUÇÃO A PARTIR DE 01 DE ABRIL

Visando regulamentar o art. 11, § 5º da Lei Complementar Estadual nº 231/2020, o Estado do Paraná publicou, em 14 de dezembro de 2021, o Decreto nº 9.810 que trata da cobrança de valores monetários a título de contrapartida da concessão dos incentivos ou benefícios fiscais, especificamente em relação aos créditos presumidos concedidos e indicados no Regulamento de ICMS do Paraná (RICMS/2017 – Anexo VII).

Neste cenário, as empresas que se utilizarem desses benefícios ficam obrigadas a realizar contribuições mensais por meio de GR-PR, que deverão ser calculadas sobre os valores usufruídos, aplicando-se o percentual de 12% com destino ao FUNREP (Fundo de Recuperação e Estabilização Fiscal do Paraná).

Como punição, em caso de não pagamento por 3 meses, consecutivos ou não, as empresas podem até perder em definitivo o benefício.

Haverá impacto significativo para praticamente todos os setores que possuem crédito presumido em vigor pelo Estado, tais como alimentação em geral, frigoríficos, laticínios, moinhos de trigos, micro cervejarias, fabricantes de café, fabricante de biodiesel, milho, mandioca, entre outros.

Alguns destes créditos presumidos foram concedidos mediante contrapartidas, tais como a vedação do crédito normal pelas entradas, incidentes nas operações interestaduais promovidas por centro de distribuição e quando industrializados em estabelecimento localizado neste Estado pertencente ao mesmo titular ou mesmo limitado a que o total dos créditos do estabelecimento não exceda o total dos débitos no período de apuração, situação que torna a cobrança ainda mais discutível.

Além disso, quase a totalidade dos benefícios fiscais em questão foram concedidos por Lei, cuja alteração por Decreto levanta, ao menos numa primeira análise, dúvidas acerca de sua constitucionalidade, bem como quanto à possibilidade de se exigir dos benefícios em vigor.

Diante do impacto que tal cobrança causará, orienta-se que as empresas se antecipem à cobrança prevista para iniciar em 01/04/22 e busquem o Judiciário, preferencialmente em ações individuais e, sempre que possível, efetuando depósitos em juízo para evitar a perda do benefício.

Clique aqui para ler a íntegra do Decreto nº 9.810/2021

FUNDO DE COMBATE À POBREZA AUMENTA CARGA TRIBUTÁRIA E ESTIMULA A DESIGUALDADE

A Constituição Federal de 1988, com base na EC. 31 de 14.12.2000 instituiu, para os Estados, Distrito Federal e Municípios, em seu Art. 82 das Disposições Constitucionais Transitórias, Fundos de Combate à Pobreza[1], estabelecendo adição de até 2% (dois por cento) ao ICMS sobre os produtos e serviços supérfluos[2].

Posteriormente foi editada a EC. 42 de 19.12.2003, dando nova redação ao parágrafo primeiro, acrescentando que as condições para a instituição do Fundo seriam definidas em Lei Complementar de que trata o art. 155, §2º, XII da CF/88[3].

Com base no que foi instituído na Carta Constitucional, o Estado do Paraná editou a Lei 18.573 de 30.09.2015, criando o Fundo Estadual de Combate à Pobreza no Paraná – FECOP.

Os produtos sujeitos ao pagamento do adicional de 2% ao ICMS, nas saídas internas destinadas a consumidor final, foram incluídos no Art. 14-A da Lei 11.580 de 14.11.1996: I- água mineral (NCM 22.01); II artefatos de joalheria e de ourivesaria e suas partes (NCM 71.13 e 71.14); III cervejas, chopes e bebidas alcoólicas (NCM 22.03, 22.04, 22.05, 2206 e 22.08); IV- fumo e sucedâneos manufaturados (NCM 24.02 e 24.03); V gasolina, exceto para aviação; VI perfumes e cosméticos (NCM 33.03, 33.04 e 33.05, exceto 3305.10.00, 33.07 e 3307.20); VII águas gaseificadas, adicionadas de açúcar ou de outros edulcorantes ou aromatizados, refrigerantes, refrescos e outros, cervejas sem álcool e isotônico (NCM 22.02), VIII produtos de tabacaria (NCM 24.01 a 24.99).

Recentemente foi editada a Lei 20554 de 05 de maio de 2021, publicada no Diário Oficial do Estado nº. 10929 de 06 de maio de 2021, acrescentando os seguintes produtos:

IX veículos automotores novos, quando a operações seja realizada sob o regime da sujeição passiva por substituição tributária, com retenção do imposto relativo as operações subsequentes, sem prejuízo do disposto no inciso X do caput deste artigo;

X independente de sujeição passiva por substituição tributária, os veículos classificados na NBM/SH com o sistema de classificação adotado até 31 de dezembro de 1.996 8701.20.0200, 8702.10.0100, 8702.10.0200, 8702.10.9900, 8704.21.0100, 8704.22.0100, 8704.23.0100, 8704.31.0100, 8704.32.0100, 8704.32.9900, 8706.00.0100 e 8706.00.0200;

XI prestações de serviço de comunicação;

XII energia elétrica, exceto à eletrificação rural.

No entendimento da administração pública estadual, todos esses produtos, inclusive o serviço de comunicação, são considerados supérfluos. Na definição do dicionário da língua portuguesa Aurélio, 7ª edição: Supérfluo Diz-se de, ou o que é demais ou inútil por excesso.

Assim, são considerados supérfluos produto como por exemplo a gasolina (exceto de avião?), que muitas vezes é utilizada como instrumento de trabalho, como meio de transporte, ou em outras atividades, como a pesca e mesmo até na atividade no manuseio de equipamento rural, que atualmente tem uma alíquota de ICMS de 29 % e passará para efeito prático de cobrança para 31%.

Os serviços de comunicação, pela sua utilização em várias atividades como internet, celular e também o aparelho fixo nos estabelecimentos comerciais e nas prestações de serviços, com alíquota de 18% para 21%, com a modernidade dos tempos, hoje se tornam indispensáveis, não podendo ser vistos como supérfluo, ou inúteis.

Vale um destaque em relação à aplicação das alíquotas para qualquer produto. A legislação estadual aponta as alíquotas a serem aplicadas[4].  No entanto, pelo sistema tributário o ICMS é calculado sobre a sua própria base[5]. Ou seja, calcula-se imposto sobre imposto, resultando em uma maior carga tributária.    

Outro produto que deveria ser repensado quanto a sua classificação como supérfluo é a energia elétrica, um bem também indispensável e essencial para a sobrevivência. Não existe, ou não deveria existir, um só imóvel que não dependa dessa fonte de energia, especialmente os da zona urbana.

Sem adentrar na análise de outros produtos quanto a sua classificação como supérfluos pela legislação estadual, vale a seguinte reflexão quanto a sua carga tributária.

Todos os produtos mencionados terão um acréscimo de 2% (dois por cento) sobre o valor do ICMS nas suas compras, como se sabe, no valor da mercadoria está incluído o imposto estadual (ICMS) que é suportado pelos adquirentes como consumidores finais, independente da sua classe social. Basta ser um comprador/adquirente que já está suportando o valor do imposto.

Na medida que a classe mais necessitada adquire qualquer desses produtos, considerados como supérfluos, estará também dando a sua contribuição para a formação do FECOP, além de arcar com o ICMS na operação de aquisição. Mas, se o objetivo realmente é destinar a essa classe de mais necessitados a contribuição do fundo, não seria, então, de exclui-los de sua contribuição? Mas sabemos que pela sistemática do imposto isto seria impossível. Assim, essa classe de pessoas acabam sendo as mais penalizadas.

A pergunta que se faz é: seria possível alguém viver ou sobreviver sem os vários produtos indicados como supérfluos, como, internet; celular; energia elétrica, etc? A resposta, com certeza, seria negativa. Então, os produtos classificados seriam supérfluos para quem? Ou isto é irrelevante e o importante seria sua arrecadação, mesmo com a finalidade de formação do fundo para o combate à pobreza? Que se diga, totalmente nobre.     

Deixando de lado a classificação subjetiva dos produtos como supérfluos, atribuída pela legislação estadual, devemos nos ater aos aspectos jurídicos para a cobrança do Fundo, encartada na Carta Constitucional, que como vimos, depende de edição de Lei Complementar, com a finalidade de estabelecer critérios para a indicação dos produtos e a formação do Fundo, inclusive indicando o seu destino[6]. Sem esse instrumento, se torna impossível a cobrança, além do ICMS da operação ou prestação de serviço, o acréscimo de 2% destinado à formação do Fundo de Reserva para a Pobreza.

A citada Lei Estadual[7] sancionada recentemente, que incluiu na também já referida legislação estadual[8] o FECOP, entre outras providências, estabeleceu como início da vigência em relação ao Fundo, noventa dias a contar da publicação da Lei, ocorrida em 06 de maio de 2021, de modo que a exigência da cobrança do Fundo seria a partir de agosto de 21.

Considerando que o Fundo adicional, como instituído, tem a mesma natureza daquele que lhe serve de referência - no caso o ICMS - sem dúvida haverá um aumento de tributo e a Constituição Federal estabelece regras próprias para sua vigência,[9] obviamente além dos 90 (noventa) dias estabelecidos na legislação estadual em seu Art. 5º[10], de modo que, a nosso ver, o Fundo poderia ser exigido no mês de março do ano seguinte de sua instituição.

Como conclusão, pensamos que as legislações estaduais (especialmente a do Paraná) deveriam ser revistas no tocante à consideração do conceito de produto supérfluo, com vistas a atender não só o princípio da essencialidade previsto na CRFB (art. 155, § 2º, inc. III), mas especialmente buscando desonerar a população que mais necessita de acesso a tais produtos.

Também manifestamos o entendimento que, quanto ao FECOP, ainda que não seja um Tributo, em essência, mas, sem dúvida, ao representar majoração direta da carga tributária do ICMS, sua instituição deve respeitar os princípios da anterioridade e noventena, podendo ser exigido, salvo melhor juízo, a partir de março de 2022.

Desta forma, o contribuinte que se sentir prejudicado com tal cobrança, pode acionar a Justiça para obter o direito de não se submeter à exigência do FECOP em período anterior.  

 

Gerson Tarosso - Advogado, Sócio do Escritório Tarosso Advogados Associados, Conselheiro e ex-presidente do Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais do Estado do Paraná, ex Auditor Fiscal, Delegado da Receita e Inspetor Geral de Fiscalização Estadual, membro do Instituto de Direito Tributário (IDT-PR).

 

 


[1] Art. 82. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem instituir Fundos de Combate à Pobreza, com os recursos de que trata este artigo e outros que vierem a destinar, devendo os referido Fundos ser geridos por entidades que contem com a participação da sociedade civil

[2] § 1º. Para o financiamento dos Fundos Estaduais e Distrital, poderá ser criado adicional de até 2 (dois) pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, ou do imposto que vier a substitui-lo, sobre os produtos e serviços supérfluos, não se aplicando, sobre este adicional, o disposto no art. 158, IV da Constituição.

[3] Para o financiamento dos fundos Estaduais e Distrital, poderá ser criado adicional de até dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, sobre os produtos e serviços supérfluos e nas condições definidas na lei complementar de que trata o art. 155, §2º, XII, da Constituição, não se aplicando, sobre este percentual, o disposto no art. 158, IV da Constituição

[4] Art. 14 e seguintes da Lei 11580/96

[5] Lei Complementar 87/96

[6] Art. 4º da Lei 20554 de 05 de maio de 2021:

Autoriza o Poder Executivo a utilizar recursos oriundos do Fundo Estadual de Combate à Pobreza – FECOP – para o desenvolvimento de atividades destinadas ao estimulo financeiro de micro e pequenas empresas, enquanto perdurar o período de calamidade pública no Estado do Paraná.

[7] Lei 20.554 de 05 de maio de 2021.

[8] Lei 11.580/96:

Acrescenta Art. 14, os incisos IX, X, XI e XII ao §9º

Acrescenta aos incisos IX, X, XI e XII ao Caput do Art. 14-A

Nova redação ao inciso II do parágrafo único do Art. 14-A

[9] Art. 150.

III cobrar tributos:

...

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que instituiu ou aumentou;

c) antes de decorridos noventa dias da data em haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b.

[10] Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, exceto no que se refere aos arts. 1º, 2º e 3º que produzirão efeitos a partir de noventa dias contados da publicação.

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